AS MUDANÇAS NAS REPRESENTAÇÕES DAS CAVALHADAS EM PIRENÓPOLIS AO LONGO DO TEMPO.
- teccernusacer
- 12 de set. de 2024
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As cavalhadas de Pirenópolis são um dos eventos culturais e religiosos mais importantes do Brasil. São parte da celebração da Festa do Divino (uma das mais antigas celebrações católicas que, em Goiás, reúne diversas manifestações), a qual ocorre na cidade desde 1819 (LUZ; CHIBANGA, 2019, p.4). Foram introduzidas nas festividades em 1826 pelo Padre Manuel Amâncio da Luz, ao qual também foi o primeiro imperador do festejo (BRANDÃO, 1974, p.24).
A intenção das Cavalhadas é a reencenação do conflito religioso medieval entre cristãos e mouros, ao qual o rei cristão Carlos Magno teria lutado juntamente com os Doze Pares de França, impedindo o avanço muçulmano na Europa. Assim como ocorre em diversos atos culturais, uma vez que a cultura está em constante mudança, visto que ela é uma representação da sociedade, ao qual não é estagnada, as Cavalhadas sofreram algumas mudanças com o passar das representações. Ao ter isso em mente, devemos levar em conta também que a tradição não se mantém fixa, mas leva consigo o movimento e a mudança que surge na sociedade. Ela é um reflexo da realidade e do meio, portanto sempre está em modificação, seja nos pequenos ou grandes detalhes.
Ao ser instituída na cidade em 1826, as Cavalhadas não fizeram muito sucesso e não tiveram muita relevância, o que acabou por colaborar com o fato de não serem representadas todos os anos. Soma-se a isso fatores financeiros, afinal quem decide se as cavalhadas vão ocorrer ou não é o Imperador dos festejos, e era comum que ele opta-se por não realizar. Nesse sentido também podemos citar a falta de cavalheiros recorrentes, uma vez que a realização das Cavalhadas não era tão importante, então logo não havia muitos candidatos a participarem. Antigamente o evento não possuía a autonomia que tem hoje. Este cenário apenas se modificou em 1960, quando passaram a realiza-la todos os anos (IPHAN, 2008, p.42).
Um dos fatores que mais chamam a atenção no evento é a ornamentação das roupas dos cavaleiros, que se dividem em azul (cristãos) e vermelho (mouros). Atualmente fazem o uso de vestimentas chamativas, carregadas de lantejoulas e com uma longa capa enfeitada com símbolos. Costumeiramente os reis usam um elmo, e os demais cavaleiros fazem o uso de chapéus.
Porém, anteriormente a isso as vestimentas eram menos carregadas e davam um ar mais simples, se comparado com as atuais. Até a mudança das Cavalhadas para o atual cavalhódromo, quando ainda ocorriam no largo da matriz, as capas utilizadas possuíam um comprimento menor, isto porque o largo era de terra e poderia sujar a capa. Também não existia a diferença entre os elmos e os chapéus, uma vez que todos usavam chapéus.
A ornamentação em torno dos cavalos também sofre mudanças. Os animais utilizavam-se de um equipamento de montagem muito mais simples. Hoje em dia são adornados com flores de papel e também caneleiras, máscaras de metal e peitoral, que podem ser de metal ou tecido (MAIA; LÔBO; CURADO, 2021, p. 111). Seus elementos são confeccionados nas cores correspondentes de seus proprietários.
Os mascarados também sofreram alterações ao longo do tempo. Assim como os cavaleiros, os mascarados também fazem o uso de flores de papel em suas fantasias, assim as roupas eram lindamente decoradas. No passado, faziam o uso de roupas mais rústicas e simples, usando, até mesmo, folhas em sua composição. Essas plantas produzem flores e assim dão origem aos costumes que envolvem sua utilização.
Como dito anteriormente, as Cavalhadas ocorriam no largo da Matriz, e assim permaneceu por um tempo. Porém devido a questões relacionado a mudanças no espaço urbano da cidade, houve a necessidade de mudança para um outro local mais bem estruturado e preparado para receber as Cavalhadas. Assim, em 1966, fica decidido que o local do evento será o cavalhódromo. Este processo dividiu a opinião de muitos, tornando-se um processo muito trabalhoso.
Desta forma, podemos perceber que sendo parte de uma cultura viva, suas modificações acompanham a transformação da sociedade pirenopolina, sendo responsáveis por construir o evento como o conhecemos hoje. Por ser parte de um evento religioso, muitos fiéis enxergam nisso um ato cristão de renovação da fé católica, ao mesmo tempo em que muitos participam sem levar em conta a religiosidade do acontecimento. Tal situação também se entrelaça as modificações da cultura que, vivendo em um mundo regido pela globalização, torna as Cavalhadas, não mais algo apenas religioso, mas também comercial.
Referências
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Cavalhadas de Pirenópolis – um estudo sobre representações de cristãos e mouros em Goiás. Goiânia: Oriente, 1974.
LUZ, Vinícius Machado; CHIBANGA, Vitor Abílio. Cavalhadas de Pirenópolis: uma performance comunitária de diferentes atores. V Simpósio da Faculdade de Ciências Sociais, Democracia e Direitos Humanos: Crise e Conquista. Universidade Federal de Goiás. Goiás, 2019.
MAIA, Carlos Eduardo Santos; LÔBO, Tereza Caroline; CURADO, João Guilherme da T. Cerúleos e encarnados cavalgam lado a lado: Ficta veritas est!. Revista Latitude, v. 15, n. 2, p. 94-116. Universidade Federal de Alagoas – UFAL, 2022.
_______. Dossiê - Festa do Divino Espírito Santo (Pirenópolis-GO). Goiânia: IPHAN, 2008.

Alanna Mendes é graduanda de História pela Universidade Estadual de Goiás e membro
do Núcleo de Pesquisa dos Saberes Ambientais e Tradicionais do Cerrado.
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